As marcas em área devastada da Amazônia um ano após o “Dia do Fogo” — Foto: Christian Braga / Greenpeace
As marcas em área devastada da Amazônia um ano após o “Dia do Fogo” — Foto: Christian Braga / Greenpeace
GERADO EM: 27/08/2024 - 04:31
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Não é a primeira vez que o fogo se alastra por vários biomas e cobre o Brasil de fumaça,atingindo o meio ambiente,a saúde humana,a economia. Houve uma mudança no crime na Amazônia. Antes,o criminoso desmatava e depois punha fogo no que sobrava. “As pessoas agora estão queimando a floresta em pé para evitar autuação por desmatamento”,me disse o presidente do Ibama,Rodrigo Agostinho. “Estão colocando fogo na floresta e depois colocando gado lá dentro.” Em São Paulo,a história é outra,mas é sempre o crime. “A gente não identificou nenhum caso de raio,curto-circuito,torre de energia que caiu ou carro que pegou fogo e os focos começaram ao mesmo tempo”,afirma o presidente do Ibama.
O fogo é resultado de dois tipos de crime. O imediato,como o da pessoa apanhada com uma garrafa de gasolina e um isqueiro na mão,em São Paulo. E o crime continuado que é o ataque sistemático às florestas e campos naturais derivado da disputa pela terra no Brasil. Este tem como vítimas o meio ambiente,os povos indígenas,populações quilombolas,unidades de conservação e as leis ambientais brasileiras. Não basta apenas prender os criminosos de ocasião. O governo precisa punir os culpados e traçar a estratégia de prevenção.
Esse foi um fim de semana terrível,porque as labaredas e a fumaça se alastraram. Os incêndios na Amazônia,no Pantanal,no Cerrado,no interior de São Paulo chamaram a atenção pela dimensão e concomitância. Os efeitos foram devastadores. A Esplanada dos Ministérios no domingo estava coberta pelas sombras,Goiânia estava sufocada,Belo Horizonte sob nuvens escuras,interior de São Paulo tinha 46 cidades sob emergência,voos cancelados,aulas suspensas,pessoas deslocadas de suas casas.
O presidente Lula estava em São Paulo e,cobrado sobre o assunto,foi para Brasília,onde encontrou o céu escuro da fumaça. Convocou uma reunião com a ministra Marina Silva e o presidente do Ibama,Rodrigo Agostinho. Foram todos ao PrevFogo. Ibama e ICMBio estão com três mil brigadistas em ação. O governo instalou uma sala de situação na Casa Civil há dois meses por causa da seca na Amazônia,que começou mais cedo este ano,e das queimadas. O Ministério do Desenvolvimento Regional e o Ministério da Defesa já levaram água e combustível para cidades ribeirinhas,onde os rios estão secando. Governo em ação é sempre o ideal. Mas é preciso mais do que isso para que não tenhamos que esperar outro agosto e,de novo,nos escandalizarmos com o Brasil devastado pelo fogo,pela fumaça,pela destruição ambiental.
Houve o agosto de 2019. O “Dia do Fogo”,10 de agosto,foi o pior dos dias,mas houve uma sequência deles em que a floresta ardeu. Naquele específico momento foi a execução do plano de produtores rurais de Novo Progresso,Altamira e São Félix do Xingu,no Pará,combinado por grupo de WhatsApp,para simplesmente tacar fogo na floresta. O INPE registrou um aumento de 300% num único dia em Novo Progresso,e 329% em São Félix. O Ibama só respondeu às denúncias do Ministério Público,doze dias depois. Das 207 propriedades que registraram incêndio apenas 5% foram autuadas. Houve até aviso prévio. O jornal Folha do Progresso publicou que os produtores rurais estavam planejando incendiar a floresta para testar o governo Bolsonaro. Era o tempo da impunidade.
Agora,o governo quer combater o crime,teve avanços estatísticos,mas houve ao mesmo tempo uma escalada do crime e dos efeitos da mudança climática que estão provocando este ano a maior seca na Amazônia em 70 anos.
— Você imagina uma cidade às margens de um grande rio depender de água — diz Rodrigo Agostinho.
É uma imagem distópica,mas hoje é realidade. A população da maior bacia hidrográfica do mundo precisa de carregamento de água. O rio Madeira não pode mais depender da água do degelo.
— Os Andes não têm mais aquele degelo que levava água para dentro das calhas do rio Madeira,a gente pode ter ali um problema permanente — diz Agostinho.
Os crimes velhos e novos,o fogo combinado no interior de São Paulo,o incêndio da Amazônia para o avanço da pecuária,fazem o Brasil arder. A inversão térmica das últimas horas pode dificultar a dispersão da fumaça. O sufoco ficará no ar. Que insensatez é esta que faz o Brasil queimar anos após anos,em agosto mais do que nos outros meses,o nosso rico e belo patrimônio ambiental?
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