Reunião na comunidade Fazenda Amar Vida Nova,em Minas Gerais — Foto: Reprodução Facebook/ César Paranhos Fotografia
Reunião na comunidade Fazenda Amar Vida Nova,em Minas Gerais — Foto: Reprodução Facebook/ César Paranhos Fotografia
GERADO EM: 09/07/2024 - 04:30
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O apoio a comunidades terapêuticas para dependentes de álcool e drogas divide dois ministérios do governo Lula. Esses estabelecimentos privados,ligados a igrejas na maioria dos casos,se baseiam na religiosidade,abstinência e em atividades ocupacionais como formas de tratamento gratuito,e por isso não são considerados unidades de saúde. O Ministério da Saúde,de Nísia Trindade,defende o fim do apoio às comunidades. Mas o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social,comandado por Wellington Dias,mantém o financiamento,com a ajuda de emendas parlamentares,em uma aproximação com bases evangélicas.
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Há uma semana,a Frente Parlamentar da Saúde Mental divulgou o relatório “Raio-X das Comunidades Terapêuticas” com dados que embasam as críticas a essas comunidades,que tiveram o descredenciamento já pedido pelos conselhos nacionais de Saúde,de Direitos Humanos e de Criança e Adolescente e de Assistência Social. A análise de 288 projetos terapêuticos apoiados financeiramente pelo governo federal,estados ou municípios entre 2019 e 2022 mostrou que 14% não tinham médicos na estrutura,28% não contavam com psicólogos e 67% não possuíam enfermeiros. Mas 95% destacaram a espiritualidade como uma forma de cura.
O relatório aponta que o investimento federal no setor alcançou R$ 560 milhões entre 2017 e 2020,segundo estudo do Conectas Direitos Humanos e o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap),mas muitos métodos dos projetos não têm respaldo científico. Há propostas baseadas em “ciência da espiritualidade” e “doutrina criacionista”,acrescentou.
Além disso,vistorias do Ministério Público Federal,Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e Conselho Federal de Psicologia em 28 Comunidades Terapêuticas em 2017 identificaram casos de internações forçadas e indocumentadas,instalações precárias,péssimas condições de higiene,suspeita de trabalhos forçados,intolerância religiosa,homofobia e até indícios de sequestro e cárcere privado com a anuência da família.
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Mas o Ministério do Desenvolvimento Social mantém o apoio às comunidades. Em nota,a pasta disse que elas são um “equipamento extra-hospitalar” e devem estar “em harmonia com as políticas de saúde e assistência social”. No comunicado,em que negou existir disputas no governo sobre o assunto,o ministério acrescentou que a internação depende de uma avaliação diagnóstica prévia e que ano passado houve 500 fiscalizações de unidades.
Representante de uma das principais comunidades terapêuticas do Brasil,o Fazenda Amar Vida Nova,Jean Carlos de Souza defende o trabalho ressalvando que a espiritualidade é um apoio,mas não a base do trabalho. Souza diz que o enfoque da comunidade que fica em Capelinha (MG) e que teve metade de suas 48 vagas contratadas pelo governo federal é a recuperação por “suporte mútuo,atividades educacionais e psicoeducativas”. Ele destaca que a internação é voluntária e nenhuma e crença é imposta.
— A presença contínua de médicos e enfermeiros não é necessária,já que qualquer intercorrência médica é encaminhada para a rede de saúde pública — explicou.
Nos últimos 10 anos,as políticas sobre comunidades terapêuticas estiveram sob as pastas de Saúde,Justiça e Cidadania. No início da nova gestão Lula,foi criado Departamento de Entidades de Apoio e Acolhimento Atuantes em Álcool e Drogas (Depad) no Ministério de Desenvolvimento Social,com orçamento de R$ 273 milhões.
O Plano Plurianual de Lula prevê o apoio a essas entidades e,em janeiro,o ministério lançou edital de contratação de 587 comunidades. Destas,585 já foram habilitadas. Se forem contratadas,a estrutura será maior que a Rede de Atenção Psicossocial do Ministério da Saúde,aponta Leo Pinho,diretor do Conselho Nacional de Direitos Humanos. Segundo dados do Ministério da Saúde,há 443 Centros de Atenção Psicossocial para tratar dependentes em álcool e drogas e 70 Unidades de Acolhimento no país.
— O grande perigo é que,na falta de CAPs,as prefeituras enviam dependentes para as Comunidades Terapêuticas — afirma Pinho,que diz que,além do orçamento do ministério de Wellington,boa parte da verba para elas vem de emendas parlamentares. — Não só do Centrão,mas de deputados bolsonaristas.
Em novembro,ao firmar no Rio parcerias com igrejas para programas sociais,Wellington Dias celebrou o estreitamento das relações com os evangélicos.
— As igrejas estão onde há parcela significativa das pessoas mais vulneráveis. O governo tem programas e a gente quer estreitar a relação para que esses programas possam acontecer junto com o povo evangélico — afirmou Dias,na ocasião.
No ano passado,mais de cem associações de saúde mental e de militância antimanicomial escreveram uma carta ao presidente Lula cobrando mudanças. O tema dividiu o governo desde o período de transição,conforme revelou a própria ministra da Saúde,Nísia Trindade,em entrevista ao Roda Viva em 2023.
— Na transição chegamos a ter diálogo com representantes de comunidades,e a nossa indicação é que esse tipo de abordagem não caberia no âmbito do Ministério da Saúde. Essas comunidades não têm a estrutura profissional de um serviço de saúde,de unidade de saúde — afirmou.
Procurado,o Ministério da Saúde não se pronunciou até o fechamento desta edição.
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